terça-feira, 4 de setembro de 2012

ATIRANDO PEDRAS E PÉTALAS… Pista virtual das motos

Pedro Hugo

“Atirando pedras e pétalas”image

www.pedrohugocavallari.blogspot.com

SE VOCÊ ALGUMA VEZ SENTIU DESEJO DE PERSEGUIR UMA MOTO E ATROPELÁ-LA, LEIA...

PISTA VIRTUAL DAS MOTOS

A pista rodoviária mais barata do mundo foi construída em São Paulo, Brasil, sem gasto algum de dinheiro público. Ela foi construída a chutes, pontapés, ameaças, palavrões, com gestos obscenos e até mortes. Ou seja, é uma pista extensa a custo zero. Esta faixa de asfalto está presente na maior cidade da América do Sul em todas suas avenidas principais. Trata-se da pista virtual construída pelos usuários de motos em São Paulo. Os automóveis precisam apertar-se para manter uma faixa exclusiva para as motos. Ela foi assim construída, sem superfaturamento e nenhuma propina. Corrupto algum pode auferir algum lucro nesta obra. Esta pista ocupa um metro da primeira faixa esquerda pelo lado direito dos veículos quatro rodas e um metro da esquerda da segunda faixa das avenidas. Assim as motos obtiveram faixa exclusiva de 2 metros para livrarem-se de qualquer congestionamento ou tráfego lento. Mas nas pistas únicas eles também reservaram sua faixa virtual. Têm eles escritura pública ou qualquer documento de propriedade? Não, e não precisam. Eles mesmos cuidam de sua propriedade virtual todas as horas do dia. Eles são usuários e fiscais. Ai de quem invadir sua área de tráfego! Eu já tive nestes 30 anos várias ameaças e alguns chutes na lataria dianteira de meus carros quando me descuidei e invadi a pista imaginária deles. Ganhei despesas com vários retoques de funilaria e alguns espelhos quebrados quando invadi esta pista fantasma. Andando em São Paulo não podemos curtir as paisagens e ler qualquer painel de propaganda. Precisamos andar ligados na guia esquerda e no retrovisor direito, se ele sobreviver, deixando a pista para as motos voarem tranqüilas. Quando nossa distração é pequena e a perturbação é mínima, eles passam em suas motos e juntam o dedo indicador ao polegar, fazendo aquele círculo conhecido nos Estados Unidos como O.K., mas que aqui, ao contrário, é um convite para que entremos para a comunidade gay. Esposa e filhos assistem a injúria silenciosa dirigida ao condutor de carro relapso. Acredito que milhares de motoristas por alguns segundos todos os dias sentem vontade perseguir o ofensor e atropelá-lo. Eu imagino e sinto dó de pessoas do interior que não sabem desta pista defendida a pontapés em São Paulo. Que sustos devem levar nossos caipiras circulando nestas avenidas de São Paulo. Nas cidades menores as motos também trafegam pelas laterais dos carros, contudo não se comportam agressivamente, pois quase todos habitantes se conhecem. Mas em São Paulo eles podem agir livremente porque todos são anônimos.

Eu sou um caipira viajado que vi a pedra fundamental desta pista ser lançada quando morei na grande São Paulo e fui treinado e domesticado por eles, mesmo assim não deixei de ser molestado por todos estes 30 anos. O último fato ocorreu há poucos meses. Deixei minha Serra Negra e fui comemorar o doutorado de minha filha em São Paulo no Restaurante que sempre curtimos desde meus filhos crianças. Na ida andávamos pela Avenida Ibirapuera pela faixa da esquerda. Nossa alegria e felicidade sofreram grande abalo quando eu estava invadindo um pouco a pista das motos por alguns segundos. Não deu nem para ver se foi murro ou ponta pé, mas o espelho da nossa Volks Space preta foi gritando pelo asfalto depois que uma moto passou. O trânsito era pesado e quando parei, meu filho abriu a porta sem o devido cuidado para ir resgatar o retrovisor e quase foi atropelado por automóvel que vinha em seguida pela nossa direita. Meu filho recolheu o que sobrou do retrovisor e colocamos no porta-malas. Por alguns minutos seguimos com nossa adrenalina alterada. Principalmente pelo perigo do atropelamento quase sofrido pelo meu filho. Almoçamos em São Bernardo Campo no restaurante famoso na chamada colônia italiana dos De Marchi. De tarde voltávamos pelo mesmo caminho, na pista contrária da Av. Ibirapuera, em direção ao bairro Pinheiros. De repente o tráfego ficou lento e parou. Após meia hora chegamos até o fato que causou o congestionamento. Das cinco faixas da Av. Ibirapuera apenas uma, a da direita, estava livre e lá na esquerda onde fica a pista de moto virtual estava estendido imóvel no asfalto o piloto de uma moto também caída e bastante avariada. Estavam aguardando a polícia técnica porque ao piloto nada se poderia fazer. A possibilidade de ser aquele o motoqueiro que na nossa ida havia nos molestado é uma chance num milhão. Mas nós todos sentimos como se fosse aquele ali. Eles são tão unidos naquele comportamento tão igual que são milhares e se parecem um. O comportamento único torna-os coletivamente um. Parecia-nos que aquele que havia quebrado nosso espelho horas antes agora havia recebido um castigo. Mas provavelmente não era o mesmo. Tentamos não tecer comentário, mas não precisávamos dizer o que se passava em nossa cabeça. Era fácil a qualquer um de nós adivinharmos o que cada um sentia. Naquele silencio de minuto, ouvi afinal alguém balbuciar: “Se aquele ali estendido é um daqueles que... chutam veículos, investem contra retrovisores, desferem ameaças, mandam palavrões contra condutores de automóveis, obrigado Senhor! Menos um!” Eu não sei quem falou, mas também não contaria...

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